Mais um hemograma no feriado de hoje. Medula se recuperando e as taxas continuam subindo, mas ainda não dá para fazer o exame da própria medula que estávamos programando para amanhã. Os neutrófilos, as células de defesa, ainda aparecem de forma tímida e não têm quantidade mínima que permita fazer o mielograma. Nova espera de 3 dias, até quinta, mas com uma checagem no curativo do catéter no meio do caminho, pois não está tudo cem porcento por ali, não se pode correr riscos e gera certa apreensão na gente. Ainda não foi hoje, deve ser até o final da semana, já começa a ficar tarde de novo. A corrida contra e a favor do tempo é uma constante no Planeta Leucemia.
Mais uma vez a rotina mais recente da qual já estamos acostumados. Almoço da Bela, almoçamos correndo e vamos para o hospital, para que ela tire o seu soninho da tarde lá, deixando sua internação menos longa. Como as taxas estavam subindo, hoje seria apenas fazer o hemograma e ir embora, pois não precisaria esperar o resultado e poderíamos cuidar depois pelo telefone da internação de amanhã para o mielograma, que estávamos esperando ansiosamente.
Mas hoje também era dia de troca do curativo do catéter. Na sexta passada já estava sob observação a pele junto à saida do catéter, um pouco avermelhada. O catéter é um corpo estranho, que o organismo tende a rejeitar e uma perigosa porta de entrada para infecções. Colocou-se a gaze da última vez de uma forma diferente. Achamos que até que funcionou, mas ao retirar a gaze hoje, parece que feriu um pouco e não está 100%. Não se corre riscos e aprendemos não deixar nada para depois. Se tiver que ligar para alguém, não se poupa ninguém. Ligamos na hora para quem melhor poderia nos ajudar, o cirurgião que implantou o catéter, que recomendou uma pomada para ser colocada junto com a gaze. Independentemente de termos novo hemograma daqui a 3 dias ele quer ver o bracinho da Bela antes. Melhor assim, todos atentos e evitando correr riscos desnecessários.
A Bela dormiu logo que chegou na caminha do day-clinic que ela escolheu. Acaba que é sempre a mesma, a última, no fundo, perto da parede, para nós a melhor, mais afastada da porta. Com tanta mexida no seu curativo, álcool ardendo, ela acabou não dormindo mais do que 20 minutos, por mais que tentássemos não incomodá-la. Saímos antes do resultado do hemograma e novamente mais um delicioso tour pela nossa cidade. Nossa princesinha pediu para ver avião, de novo. Agora, de preferência os pequeninhos que ela mais gosta, pois fazem menos barulho. Na sua linguagem de hoje os que fazem muito barulho são os "ai, muito ouvido!". Fomos lá nós de novo para a cabeceira do Santos Dumont, parando o carro em frente à Escola Naval. Recomendamos fortemente esse passeio. Melhor quando eles pousam e decolam do sentido Pão de Açúcar - Ponte Rio-Niterói. Não foi o caso de hoje. Besuntamos Off! na baixinha e ela anda bastante por ali, vendo o mar, os barcos, as pessoas pescando, passendo de bicicleta, e até os aviões. Hoje, final do feriado, o movimento estava bem mais intenso do que ontem e ela curte à bessa. Vendo os aviões maiores nos fingers do terminal novo do aeroporto, comenta: "Olhas os aviões nas casinhas deles, com o bumbum de fola!", e dá boas gargalhadas, pois sabe que está falando coisa engraçada. Comentamos que os aviões carregam pessoas e ela dá "Tchau pessoas!". Realmente o humor dela reflete muito o seu estado clínico.
Seguindo no tour, erramos uma rua pelo Centro para voltarmos para casa, pois o Aterro estava fechado e resolvemos seguir em frente e ir mostrar para ela a Igreja onde Papai e Mamãe se casaram, no Mosteiro de São Bento. Pouca gente, o altar sendo reformado, poucas luzes, mas suficientes para poder se admirar a beleza e riqueza daquela igreja. Também imperdível. Reforço no Off! e ela aproveitou para andar bastante no pátio da entrada. Houve ali uma energia especial. Ela não queria ir embora e andou pela entrada da Igreja um bom tempo, subia e descia uma rampa para deficientes, seguia caminhos das cerâmicas preto e branco da entrada da Igreja e admirou cada detalhe da natureza, uma pequena folhinha seca, um simples matinho em um canteiro com uma árvore e não se conteve: "Nossa, que avole linda!". Para nós é tudo paisagem, pano de fundo, mas para ela um dedinho pequeno, delicadamente curtindo os detalhes do que temos e não damos o devido valor.
Enquanto víamos os aviões, recebemos ligação dos médicos, falando sobre as taxas. Tudo subindo, plaquetas subiram mais e agora bem acima dos mínimos desejáveis, glóbulos vermelhos estáveis e glóbulos brancos, as defesas, também subindo. Infelizmente não continuou a quase progressão geométrica dos últimos exames que adoraríamos ver em gráficos do Excel. Os leucócitos subiram mais, mas ainda abaixo do que pode ser considerada uma pessoa com imunidade. Os neutrófilos novamente demonstrando toda a sua timidez. Um pouco mais do que do último exame, ainda baixíssmas defesas, mas não ainda em quantidade suficiente que nos sugira fazer o mielograma amanhã. Nos acalmaram que é natural, que esse último bloco de quimioterápicos é realmente de arrasar quarteirão. Junta-se a isso o efeito da própria QT sobre a alimentação, que ficou mais difícil e que não contribui e retarda a recuperação. Nos foi dito que nem sempre a medula se recupera rapidamente, levando usualmente de duas a três semanas após o final do bloco. Completamos 2 semanas hoje e um reforço de vitamina entrou hoje para ajudar na recuperação geral.
Para fechar o alegre passeio pós-hospital de hoje, paramos em uma farmácia próxima à nossa casa para comprarmos esse reforço e Tia Gabi e Tio Bê puderam ver a Bela parada em frente ao seu prédio. Pat, a Bela acha que é o seu prédio, pois você estava lá da última vez que veio de Brasília... Enquanto conversávamos ao lado do carro, oba, outra boa surpresa! Tia Lulu e Tio Paulinho passaram e também puderam ver a Bela, que adorou poder fechar o dia ao menos vendo, que seja da janela entreaberta do carro, mais gente, e gente que gosta muito! Foi bom revê-los também amigos!
Hoje falamos por telefone algumas vezes com a Nana. Está feliz da vida, com a Vovó Cecília em Angra, na companhia dos Dindos, Tia Verinha e Tio Lipe e toda a trupe de priminhas e amiguinhos que lhe acolhem muito bem. Volta amanhã ou quarta. Saudades da nossa morena tão querida e amada.
Fechamos o feriado com a visita da Vovó Lena e Vovô Beto, que chegaram de viagem e aniversariamos hoje o terceiro mês desde a internação da Bela, no dia 21 de janeiro. Como dissemos ontem, são datas que ainda estão bem marcadas nas nossas memórias. Vemos muito o que já se passou, mas não conseguimos deixar de olhar para frente o quanto que falta. O tempo no Planeta Leucemia é muito relativo. Hoje mesmo comentamos sobre a espera de mais 3 dias para novo exame, que parece uma eternidade, falamos de até 3 semanas para a medula se recuperar, que parece um tempo sobre o qual se corre contra e agora aniversariamos 3 meses, que nos dá sentimentos mistos de parece-que-foi-ontem e às vezes de um passado longínquo.
O que sabemos é que a companhia de tantos amigos e familiares, que aqui religiosamente vêm para saber como é que estamos, que nos querem bem, é que nos ajuda a enfrentar todo esse tempo. Às vezes longo, às vezes rapidíssimo, tempos ruins, nublados e outros muito bons, esolarados. Tempo de rezar, tempo de meditar, tempo de descansar, tempo de refletir, tempo de pensar, tempo de se programar, pouco tempo para curtir. Todos vocês ligados no nosso tempo, há tanto tempo.
Obrigado mais uma vez, bons amigos. Fiquem com Deus e até amanhã.