terça-feira, 25 de maio de 2010

Acabou?

Escrevemos sobre a última semana e também sobre o último dia do tratamento, mas tivemos a confirmação de que ainda não acabou. Alguém nos disse que é como se fosse o caso de um ex-fumante, que para de fumar, mas leva tempo, muito tempo, para que seu organismo se veja livre dos malefícios do fumo. No nosso caso, levará ainda muito tempo para que o organismo da Bela, e em especial sua medula, voltem a funcionar em seu ritmo normal. E sentimos isso bem próximo, desde o final da semana passada, um susto, que ainda não terminou.

Quinta-feira passada a baixinha chega bem arriada da escola e febril. Foi deitar. Tínhamos feito um exame de sangue ultra completo no dia anterior, para o qual sequer nos preocupamos em pegar os resultados, mesmo que parciais. Tranquilos, fomos ver como estavam as defesas, e para nosso espanto, havia muito poucas defesas. Lição de casa, febre, pico de 38° C, hospital. E não foi apenas 38° e sim um pico de 39° C e lá estávamos nós fazendo as malas para irmos para o Copa D'Or. Novo hemograma feito no day-clinic e para nossa surpresa as defesas estavam mais baixas ainda, quase nada. Internação imediata e início de antibiótico venoso, como manda o protocolo.

Volta tudo nas nossas cabeças. Acesso venoso, chora para tomar a picada, reclama da mão enfaixada, bombas apitando. E agora está maior e não cabe no berço, não tendo nós mais uma cama extra no quarto, dificultando a dormida do acompanhante extra. Primeira noite complicada, anotando a temperatura de hora em hora, fazendo uma curva térmica, de febre que graças a Deus nunca mais voltou desde a madrugada de quinta para sexta. Era monitorar a febre e exames de sangue para ver se a febre voltava. Infelizmente o acesso venoso não permite colher sangue e mosquitinhos no seu antebraço foram feitos durante esse período de internação. Novo exame na sexta e ficamos mais animados, pois as defesas começavam a subir um pouco, como a febre tinha cedido de vez. Optou-se por não ter que fazer mais uma picada no sábado, aguardar um pouco mais de tempo e fazer novo exame no domingo. Estávamos mais do que esperançosos que sairíamos no domingo a tarde, que as defesas teriam voltado com mais força ainda, na tendência de subida da sexta, e já com mais de 48 horas sem febre. Ledo engano e um baita susto! Defesas mínimas, quase que nenhuma, no domingo, mostrando que sua medula sofria um impacto muito forte, do que possivelmente seria uma virose, infelizmente sem podermos nos furtar da hipótese que tinha que ser levantanda pelos médicos da volta da doença. Isso nos apavorou.

Como na medicina não se pode trabalhar com hipóteses, marcou-se mais um dos famigerados mielogramas que tanto fizemos ao longo do tratamento, para podermos ver como estava o sangue da medula, pois o sangue periférico nos dizia que alguma coisa não estava bem com a capacidade da medula de produzir defesas para o organismo da Bela se livrar da virose. Não dormimos.

Segunda-feira cedo, mais um procedimento, tendo toda aquela via crucis da qual gostaríamos de esquecer um dia, pois é um sofrimento ver a nossa pequena ir apagando com a anestesia. Ela mesmo não entende o que está acontecendo e tem um certo desconforto. A quase meia hora que esperamos parece uma eternidade. Acaba o procedimento, recebemos a Bela sedada, voltando grogue da anestesia, enquanto o Rodrigo saia com uma caixa de isopor e diversos tubos com o sangue puncionado da medula para levar em dois laboratórios diferentes, que fazem exames complementares.

Começava ali outro período angustiante, da espera do resultado do exame. Aproveitou-se que a Bela estava anestesiada e fizeram mais um hemograma, que mostrava que dessa vez o número de neutrófilos era Zero. Nunca houve isso, mesmo em momentos mais duros do tratamento da Bela, em que sofria o impacto de fortes quimioterápicos venosos. Foi um longo e muito duro dia, que terminou tão duro como começou, pois a resposta urgente pedida ao laboratório nos dava um laudo pouco conclusivo, de que havia células imaturas, não podendo se afirmar se seria a doença voltando ou células alteradas por um forte quadro viral. Estamos convivendo com essa angústia e conviveremos com ela por mais longos 10 a 12 dias. O exame terá que ser repetido.

Optou-se por começar logo um estímulo à medula na noite de segunda, pois não seria prudente deixar um organismo sem defesas contra as bactérias por tanto tempo, pelo menos desde a manhã da quarta-feira, quando tinha sido feito o primeiro exame desse período. Hoje, na hora do almoço, mais um estímulo à medula, de uma medicação chamada Granulokine que foi aplicada de forma venosa, para que houvesse mais um exame de sangue no final da tarde, para ver como a medula teria reagido em menos de 24 horas de estímulo. E, para nossa felicidade, reagiu. As defesas voltaram, o que nos permitiu suspender o antibiótico protocolar e voltarmos com a Bela para casa, após 5 dias de hospital.

Certamente foi um alívio para nós termos a Bela em casa, mas agora é esperar passar esse período do que esperamos que tenha sido um vírus oportunista que fez um belo estrago na medula e consequente desarrumação em todas as taxas do seu sangue. Em tempo, o estado clínico da Bela, após a febre ceder, foi sempre muito bom, sempre bem humorada, se alimentando relativamente bem, brincando, pulando e cantando no quarto do hospital, e nós desesperados para que ela não perdesse o acesso venoso em sua mãozinha. Até pensar em pular corda com o soro ela pensou em fazer...

Como dissemos, agora é esperar, esperar uns 10 a 12 dias após esse quadro, terminar o estímulo à medula e ir colhendo novos exames de sangue para ver como as taxas estão se comportando. Teremos que fazer novo exame da medula, o mielograma, para termos certeza de que sua medula esteja realmente limpa, sem nada de células que não deveriam mais estar ali. Para aqueles que se lembram, tivemos em uma situação mais ou menos semelhante à esta ao longo do tratamento quando tivemos que repetir um mielograma de rotina por estar com células alteradas devido a um processo de virose. No final era apenas a virose. Era outra época do tratamento. Agora, não temos a quimioterapia e tudo se torna mais angustiante. Então, temos mais um tempo de angústia, mas com fé de que teremos uma resposta positiva, para a qual pedimos que todos vocês que sempre estiveram aqui por perto, aqueles que tem um canal mais estreito com Ele, cada um do seu jeito, do seu modo particular, peçam por nós, para que a Bela esteja verdadeiramente curada.

Agradecemos a todos vocês que de alguma forma ficaram sabendo desses 5 dias de sufuco que passamos, que nos mandaram mensagens e nos deram telefonemas carinhosos, assim como tiveram a Bela em seus pensamentos e orações. Isso nos fortalece muito. Voltaremos com as novidades que tivermos nos próximos dias, escrevendo aqui no blog. Quem for do twitter pode acompanhar um pouco através do @rcapistra ou twitter.com/rcapistra, que o Rodrigo tem twitado sobre a Bela sempre que pode. Por favor rezem por nós. Daremos notícias.

Um beijo carinhoso para todos vocês. Fiquem com Deus. Bel e Rodrigo.

domingo, 9 de maio de 2010

CHEGOU O DIA!!!

Chegou o dia que tanto esperávamos, o dia que tanto sonhamos, que tanto contamos. Hoje, dia 9 de maio de 2010, a Bela toma o último quimioterápico da sua vida. Assim seja!

Como mamãe chorou de emoção... Como se um filme passasse na sua cabeça. Era tarde e toda a casa dormia naquele domingo. Só ela acordada, como foram mais de 300 outros dias parecidos com aquele. Só que aquele era o último. Não iria se repetir. Nunca mais. Nossa Senhora estava ali presente. Ela tinha certeza. Era dia das mães. Ela estava lá. Ela rezou já não se lembra quantas vezes a Ave Maria segurando a medalhinha de Nossa Senhora de Fátima que a acompanha desde os gêmeos (...) com uma das mãos e a mão da Bela com a outra. A Bela estava linda, serena, tranqüila, como sempre dorme, um anjinho.

Assim foi o nosso último dia de quimioterapia. Bel lembrou de tudo e de todos vocês. Lembrou mais uma vez de agradecer por tudo. Acho que nunca encontrará as palavras suficientes para tal, mas enfim, só para saberem de como tudo aconteceu.
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Foram mais de 800 dia de tratamento, quase dois anos e meio e confessamos que ao longo de todo o tratamento perdemos as contas de quantos dias de internações no Copa D’Or, de quantos exames de sangue, mais de 200 com certeza, de quantos dias de quimioterápicos, de check ups, de intervenções, de intercorrências, de sustos, mas agora passou! As páginas desta história vão sendo lentamente viradas, mas já devidamente escritas e registradas no livro das nossas vidas.

Ainda temos alguns deveres de casa pela frente. Agora uma serie de exames de check-up de coração, ultrasom de abdome e exames mais completos de sangue. Em breve consulta com hematologista e novos planos de exame. Pelo que entendemos, nestes primeiros 6 meses as consultas e os exames devem ser mensais, depois provavelmente espaçaremos. Bela também deve continuar com a imunidade ainda mais baixa nestes primeiro semestre sem os quimioterápicos até a medula se recuperar plenamente, enquanto isso, vamos mantendo toda a atenção e cuidados de sempre. Ainda mais que temos o inverno pela frente...
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Iniciamos agora o período de 5 anos de “espera”, que também não é muito fácil. Período em que deixamos de ser ativos para sermos ainda mais pacientes e esperarmos por bons resultados a cada exame realizado. Assim seja!! Após este período Bela recebe “protocolarmente” o diagnóstico da cura, o que para nós, já é um fato hoje.

Chegou o dia tão esperado, aquele dia que parecia nunca chegar lá no início do tratamento. Hoje temos uma Bela radiante, que conta com um fantástico mundo imaginário, dando ordens para seus amigos (as vezes também imaginários), pais, primos e quem estiver pela frente. Ela é a mãe, a médica, a professora. Liderança absoluta, fortaleza que a vida lhe impôs e que esperamos que tire dela o seu melhor proveito. Aos poucos vamos dosando sua sede de aproveitar ao máximo as brincadeiras sendo sempre a famosa líder. Difícil fase de aprender a perder nos jogos. Os campeões de audiência por aqui são o Can Can (o Mau Mau da nossa época), o Lince, o Mico, Pega Varetas e tantos outros. Sem contar seus desenhos incríveis com menininhas sorridentes e jardins floridos que já enfeitam nossos armários junto com tantos outros incríveis desenhos da Nana.

Que delícia ouvir as histórias das duas na escola, agora praticamente com vidas iguais, aniversários, lanches, amigos, apostilas, boletins, avaliações, festas, infância! Assim, como deve ser a vida de uma criança, cheia de brincadeira e feliz! Que bom ver as duas chegando animadas em casa e brincado, agora sem muita vontade de fazer grandes programas, sentimos que curtem a casa e principalmente, que se curtem. E como! Brincam, ouvem música, dançam, jogam. Lógico que as vezes, brigam e se implicam, mas na maioria das vezes como fazem companhia uma para a outra, uma graça.

Bela e Nana continuam com seus temperamentos e jeitos bem diferentes e complementares. Nana continua assim, mais política, talvez um ainda um pouco mais tímida, mas aos poucos vencendo e desabrochando. A escola vem desempenhando seu papel tão importante para seu desenvolvimento. Muito sociável, Nana ama ter amigos! Hoje mesmo ela perguntou se poderia ir para uma escola maior para ter mais amigos. Não sabemos a quem puxou... Depois perguntou quantas pessoas tinham no Brasil. Mamãe respondeu que tinha 180 milhões, então ela ficou feliz e concluiu que daria para ter muitos amigos.

Com segurança Nana começa a enveredar pelo maravilhoso mundo da leitura, com todo o interesse e fascínio que ele merece. Fonemas devidamente aprendidos, palavras que passam a fazer sentido e ela maravilhada vai começando a entender placas, histórias e pequenos livros. Que máximo é para nós pais podermos ser testemunhas deste momento tão mágico. Bela é lógico que está louca para também aprender a ler e fica repetindo os sons das junções das sílabas pronunciadas pela Nana, como um gravador. “Sa, as, sa, pa, pa, to,to”, “sapato”, “Bela, para de me imitar”, “Nana, eu também sei ler”, e assim vão os diálogos. Cabe a nós nos divertirmos.

Bela enquanto isso continua se divertindo com suas amigas e se não tiver amiga, tudo bem, brinca com a Nana, com papai e mamãe, ou sozinha, no seu mundo imaginário, onde é a médica, a mãe, ou um bichinho, qualquer coisa. Normalmente, tem vários filhos, 4, 5 as vezes 8. Vários são “levados” e ficam de castigo. Seria uma projeção? Pois é, as vezes temos que colocar a bichinha um pouquinho nos eixos, pois volta e meia tem uma manha ou outra mas a hora de educar é agora, mas nada que podemos reclamar. Hoje ela é uma menininha plena, segura e feliz.

Agora chegou a hora então de agradecer. Agradecer a todos, por tudo! Nada melhor então do que uma missa. Para isso, estamos esperando nosso amigo Padre Klein chegar de viagem e marcar dia, hora e local. Será em Junho. Assim que tivermos isso fechado, passamos para vocês.
Um grande beijo e muito obrigado por estarem conosco nesta longa e linda caminhada de fé, esperança e amor até aqui.

Fiquem com Deus e até logo.
Bel e Rodrigo

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Última Semana

Havia uma luz no fim do túnel. Há uma luz no fim do túnel. Começamos a colocar os óculos escuros para não nos ofuscarmos com a luminosidade que está chegando. Luminosidade de um mundo novo e diferente daquele que existia quando entramos nesse breu, há mais de dois anos atrás. Um mundo novo, uma nova adaptação, um período novo em que teremos que aprender o que fazer sem as rotinas diárias do tratamento. Algumas rotinas ainda continuarão por mais 6 meses, como se fosse uma forma gradual de irmos nos adaptando ao “não mais fazer muita coisa”, muito pouco quando comparado à infindável quantidade de remédios e quimioterápicos que a Bela toma e os exames que faz.

Chegou a semana final. Começou hoje, segunda. Faltam sete dias de quimios orais noturnas, como fizemos paulatinamente nas última 83 semanas, sem falhar um único dia sequer. Confessamos que falhamos um único diazinho, uma noite em que estávamos mais do que cansados dentro de tantas outras, mas que nos causou um impacto emocional desproporcional ao acerto que se faz na dosagem do dia seguinte. Dedicação sem fim, em especial da mamãe, se entregando por completo no tratamento, exames e cura da nossa guerreirinha. Não era só atenção à farmácia, posologias, remédios que entram e saem, mas atenção a tudo o que gira em torno dela, desde espirros de amigos na sala de aula, mãos sempre bem lavadas, exames de rotina sem fim, sem sermos paranóicos e tentar fazer com que ela tivesse uma vida normal durante todo esse período. Em parte teve.

Quinta-feira teremos a última QT intramuscular, que nos acompanha pelas últimas 9 semanas, quando o organismo não mais reagia às ingestões orais semanais deste quimioterápico, nosso velho, conhecido, bom, mas estabanado amigo MTX. Não podemos prometer à Bela que essa será a última injeção no seu bumbum, pois não sabemos a exata rotina que nos espera, para colocar as todas as vacinas que deixou de tomar em dia, ou as travessuras que ainda aprontará. Podemos prometer que deste protocolo do tratamento, sim, será o último mosquitinho no bumbum, que ela tanto detesta.

Não podemos prometer que os mosquitinhos no braço, para os exames de sangue acabarão, pois eles nos acompanharão durante os próximos 5 anos. Ao menos estes ela vê e já nos disse que não gosta de mosquitinho no bumbum, que gosta é de mosquitinho no braço. Mais uma vez a resignação bate à nossa porta, colaborando totalmente com o inevitável, como diversas vezes durante o tratamento.

Na noite de domingo, dia 9 de maio, teremos a última dosagem de quimio oral. Religiosamente dada após duas horas da última refeição, por menor refeição que fosse, como uma simples água de coco. Levamos as instruções ao pé da letra, adentrando muitas madrugadas para poder lhe dar os remédios enquanto dormia. Quem sabe, madrugada de segunda e não noite de domingo... Domingo, 9 de maio, Dia das Mães, coincidência mais do que merecida, àquela que tanto se dedicou pela cura da nossa pequena, hoje já não tão pequena, Bela. Homenagem àquela certamente entregou metade de sua vida à cura da Bela nos últimos dois anos.

Chegamos ao fim do tratamento, chegamos ao início de uma nova fase. Uma nova fase de exames de checagem, para atingirmos a tão desejável palavra: cura. Mesmo que adjetivada por um “protocolarmente”, que é o que podemos ter e tanto queremos.

Chegamos ao fim de 2 anos, 3 meses e 3 semanas de tratamento, desde a internação no dia 21 de janeiro de 2008. Iniciamos um novo período de 5 anos. Começamos um tratamento com a Bela com 1 ano e 10 meses e terminaremos com ela com 9 anos de idade. Doença dura e desumana, mas que muito nos ensinou, durante todo esse tempo de tratamento, todos ensinamentos aqui relatados.

Cabe-nos aqui somente dizer um MUITO OBRIGADO a todos vocês que estiveram esse tempo todo conosco, nos apoiando, nos incentivando, nos dando colo nos momentos mais difíceis. Não nos esqueceremos disso jamais.

Fiquem com Deus. Com carinho, Bel, Rodrigo, Nana e Bela