D159, setecentos e setenta e sete, setecentos e setenta e oito,...

...setecentos e setenta e nove. Pronto! Setecentos e setenta e nove neutrófilos apareceram no hemograma de checagem de hoje. Ainda é pouco, mas foi uma quantidade suficiente para voltarmos para casa e não termos que ficar com a Bela internada, entrando no antibiótico, que duraria no mínimo uma semana. Conseguimos pelo momento escapar das tão bem conhecidas intercorrências do Planeta Leucemia. Dia de apertar as nossas medalhas fortes contra o peito, pedindo para que tudo continue assim do jeito que está.

Optamos por ir de manhã, antes do almoço, achando que seria rápido, uma simples ativação do cateter para colher sangue para o hemograma e mais uma troca de curativo, a tempo de estarmos em casa para o almoço das meninas. Nana quis ir também, uma vez que falamos que ia ser só um pulinho. Quando falamos que ela ia, a Bela soltou o "legal" mais intenso e verdadeiro que poderíamos ouvir, enquanto se preparava para ir para o "pital", que aceita resignada, no maior bom humor. É o seu programa, não diríamos que é o seu favorito, mas é o que pode ter no momento. Entretanto, há muito tempo que não vivenciávamos os famosos "poréns" do Planeta Leucemia. Esquecemos deles e hoje passamos umas duas horas e meia de agonia. São chamadas do Planeta Leucemia que nos batem mais uma real, para que estejamos sempre atentos a tudo e não deixemos as nossas guardas baixarem. Ainda é muito cedo para relaxarmos...

Quando chegamos no hospital, ligamos para a hematologista para relatar o quadro: os espirros e tosses da Bela e, infelizmente, o nariz escorrendo um pouco, e com secreção, os sintomas típicos de um resfriado. Para quem não tem defesas, todo cuidado é pouco. Ao invés de fazermos o hemograma de checagem e irmos embora, ela pediu que ficássemos esperando pelo resultado, pois dependendo do que tivesse de defesa, teríamos que tomar alguma decisão sobre o que fazer com a Bela. Vínhamos de simpáticos 63 neutrófilos na quarta-feira, considerados zero pelos médicos. Já vimos traço em outros exames passados e não saberíamos afirmar se a medula já poderia estar se recuperando e mostrando taxas de defesas ascendentes. Aguardamos o resultado com muita esperança. A verdade dói, mas a dúvida mata.

Como o programa de hospital seria rápido, o que fazer com a Nana por pelo menos duas horas? Papai desce a Figueiredo Magalhães, compra um bilhete de ida e volta do Metrô na Estação Siqueira Campos e vão juntos até a Cinelândia. Tudo isso, brincando com a Nana, que sabe direitinho o que é a esquerda e a direita dos desembarques e que estranhou ouvir os nomes Botafogo e Flamengo, achando que eram os times de futebol, perguntando onde estavam o Vasco e Fluminense. No Centro, outro programa que a Nana adora: andar de taxi. "Por favor, Aeroporto Santos Dumont". Fomos dessa vez por dentro do aeroporto. A Nana adorou desde a porta automática da entrada da nova área de embarque, as pessoas entregando seus bilhetes de passagem e as malas, lacradas por "aquele negócio verde" e entrando nas esteiras, as pessoas novamente passando na revista e entrando no avião pelo finger e até as malas subindo para dentro do avião na esteira rolante. "Mamãe já sei ler TAM e Gol!", falou assim que voltou para o hospital. Já era hora de voltar, quando a mamãe liga avisando que o disk-delivery da Evinha já tinha chegado no Copa D'Or e que havia pedido almoço para as duas. Outro taxi, mais metrô e caminhada da estação de volta para o hospital e nossa fofinha média já estava desmontando. Ainda deu tempo de pedir para comprarmos uma caixa de bombons, parte para ela é claro, mas "Também para as enfermeiras que cuidam da Teté no hospital, mas só as meninas". Coitado dos enfermeiros, que são poucos, mas acabaram ganhando o seu bombom. Distribuiu tudo no andar da pediatria, procurando pela médica de plantão que estava atendendo em um quarto e encantando todos com sua graça. E a nós também.

Grande parte do sofrimento de hoje foi mais vivido pela Bel do que pelo Rodrigo, pois o programa com a Nana fez com que somente voltasse a se preocupar sobre o resultado do exame na porta do hospital. Obrigado Nana por nos dar vida no Planeta Terra! A cara de alívio da mamãe, de já ter falado com os médicos sobre os 1.900 leucócitos e 779 neutrófilos, poucos, mas já estão voltando, em quantidade suficiente para começarem a defender a Bela de qualquer infecção, mas para ficarmos em estado 1.000% alertas, lavando o nariz da Bela com soro o tempo inteiro para que não se acumule secreção, atentos a cada espirro e, mais uma vez, de olho no seu estado geral. Em paralelo boas notícias, com as plaquetas em um bom nível e as hemáceas dando sinais que a parte vermelha está se recuperando, afastando no momento a necessidade de transfusão.

E que estado geral! A Bela tem perguntado insistentemente, quase que todos os dias, pelas priminhas e pela Dinda, que não via há mais de duas semanas. Visitas dos vovôs e a Dinda, Carol, Bia e a amiguinha Tati, vem brincar com a Nana e Bela, uma vez que todos da pequena família estão bem, sem nenhum sintoma de doença. A baixinha não parou um minuto, correu sem parar, nos tranquilizando até o momento de que a turma da defesa está fazendo sua parte. Temos que ter muita fé de que reforços de neutrófilos estão chegando, sendo fabricados a cada minuto por uma medula que mostra que sente o efeito duro do tratamento, mas nos dá sinais de vitalidade, quando lhe dão um descanso protocolar. A foto do lado foi tirada hoje com as 5 meninas, rindo de uma palhaçada da Dinda e a Bia com mais uma janelinha aberta.

Saímos hoje do hospital quase 3:30 da tarde, sem perceber que era para estarmos famintos, com um sentimento de alívio, de que algo muito grande passou perto, uma daquelas sensações de que escapamos por pouco de um acidente grave, ou algo do tipo. Risos meio bobos, talvez um pouco amarelos, poucas conversas, bem quietos no carro, mas no fundo agradecendo a Deus, à enorme corrente positiva que há em torno da Bela, que demonstra imediatamente sua vivacidade, soltando uma de suas pérolas sentada no banco do carro, nos dando o "click" que precisávamos, para voltarmos a que planeta não sabemos mais, retornamos à nossa vida rotineira, começando a cantar com elas as suas músicas preferidas e entrar nas suas brincadeiras. Obrigado!

Continua o estado de alerta total, mas agora sabemos que existem defesas, que talvez já sejam suficientes para uma febre, o que antes o seu organismo era sequer capaz de produzir. Continuemos firmes e confiantes de que essas tosses, espirros e coriza desapareçam, que seu organismo combata logo qualquer invasor não desejado, para seguirmos nessa batida sem intercorrências. Seria muito bom que fosse sempre assim, com a baixinha se defendendo do jeito que pode, sentindo somente os trancos dos seus desajeitados amigos quimioterápicos, parceiros de jogo.

Essa semana é de mais checagens e de mais um mielograma, o exame de checagem da medula no final da semana. Tentaremos fazer também o exame de checagem do rim, tão adiado pois não encontrávamos agenda com as semanas sim e não da fase passada de tratamento. Além disso, não achávamos recomendado passar em um laboratório sem defesas. Acaba junho, pulamos do primeiro para o segundo semestre do ano, começamos uma nova semana, um novo mês. Tenham todos excelentes dias e fiquem com Deus.